Dialogo entre profissionais da indústria de brinquedos e da educação

Ângela Renso Madeira

Mary Iglezias de Carvalho Lopes e Edna Marchini

Luis Illanes

Adailson Parra da Silva


Mariano de Araújo Bacellar Netto

INTRODUÇÃO:


INTRODUÇÃO:

Muito vem acontecendo no mercado de brinquedos nos últimos anos:

  • A publicação das Diretrizes Curriculares Nacionais de Educação Infantil, em 2009[1], documento que estabelece “a brincadeira e as interações” como eixo de trabalho para o sistema de educação infantil público e privado.
  • A Lei 11.104 de 21 de março de 2005 que dispõe da obrigatoriedade da necessidade da instalação de brinquedotecas nas unidades de saúde que ofereçam atendimento pediátrico em caráter de internação. 
  • O “boom” do mercado imobiliário e a epidemia dos condomínios-clube: “Um condomínio-clube é caracterizado por ser um empreendimento com grandes áreas de lazer, que aproveitam a disponibilidade de terrenos com áreas usualmente superiores a 8 1.000 m²”.

Esses acontecimentos atingem diretamente os fabricantes de brinquedos, pois a demanda de novos “equipamentos” para a montagem desses “novos espaços” passa pela correta compreensão da importância do brincar e pela revisão da “resistência / durabilidade” dos brinquedos para USO COLETIVO. O conceito e a qualidade dos brinquedos para uso coletivo são diferentes dos considerados no processo de fabricação daqueles destinados ao USO DOMÉSTICO, foco da indústria nacional nos últimos 30 anos. Para que tenhamos acesso a esta significativa fatia de mercado se faz necessária à sistematização de requisitos mínimos necessários para o desenvolvimento de brinquedos com outro padrão de qualidade. É imprescindível se atentar para as características das interações que eles proporcionam e suas contribuições para o desenvolvimento infantil.

O desenvolvimento de brinquedos para uso institucional requer investimento e empenho para criação de novos conceitos por parte da indústria. Essa formação considera um “espaço para diálogo” através de encontros entre fabricantes de brinquedos e representantes de instituições de ensino, saúde, lazer, Organismos Certificadores de Produtos (OCP’s) e/ou técnicos de laboratórios acreditados pelo INMETRO, com o objetivo de transmitir concepções pedagógicas, de higienização, durabilidade, embalagem e segurança aos empresários e designers que atuarão no desenvolvimento de brinquedos de uso coletivo, um grupo de trabalho. 

As normas de segurança atuais estabelecidas pelo INMETRO não garantem a “qualidade” no que se refere à durabilidade e tempo de vida útil dos produtos, pois, como apontamos anteriormente, foram desenvolvidas considerando brinquedos para uso doméstico que muito se diferenciam de brinquedos para uso institucional. O brinquedo de uso institucional pede um sistema de avaliação mais criterioso. Os brinquedos para este fim precisam de “certificados de garantia para uso coletivo exaustivo”.

Para aproveitar este momento, a indústria precisa se reinventar, aproximar-se dessas instituições e inovar sua forma de pensar e suas estratégias de ação. Temos aqui, situações problema que pedem um trabalho de co-criação: estudar juntosuma forma de levar um produto a um mercado específico.

Dentro desta proposta, a ABRINQ organizou, em maio de 2014, a primeira reunião denominada “Reunião Técnica de Brinquedos Institucionais”, contando com a presença de profissionais da educação, de gestores que tem desafios diários em cidades grandes como São Paulo, Florianópolis e Belo Horizonte e de 25 empresas fabricantes de brinquedos. Além da exposição das diferentes realidades, o evento considerou prudente abordar questões mercadológicas e estéticas. Houve palestras com um professor de marketing, intitulada “Inovação no setor de brinquedos – uma aliada para a educação”, e com um professor de design: “Produtos para educação Infantil – aumentando a competitividade e agregando valor ao produto”. 

Um calendário com reuniões semelhantes se faz necessário em função dos inúmeros aspectos que precisam ser analisados em conjunto: o que produzir, com que qualidade, a que preços, como comprar, como embalar, enfim, como atuar diante desse novo contexto.  

Durante os dias 20 e 21 de janeiro de 2021, um segundo evento virtual com a mesma proposta aconteceu por intermédio da ABBri – Associação Brasileira de Brinquedotecas: O 1º. Simpósio Internacional da ABBri “A brinquedoteca nos diversos contextos” simultaneamente com o 3º. Simpósio do Gebrinq “O Brinquedo e a assistência da enfermagem à criança e sua família”.  Entre muitos outros temas abordados aconteceu um rico momento de interação intitulado “Diálogo entre os profissionais da indústria de brinquedos e da educação – BUC: Brinquedos de Uso Coletivo Intenso”. Sobre os aspectos levantados nesse diálogo é que desenvolvemos este artigo.


[1] A Resolução CNE/CEB 5/2009. Diário Oficial da União, Brasília, 18 de dezembro de 2009, Seçao1,p.18 fixa as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil.

DESENVOLVIMENTO

MEDIAÇÃO POR ÂNGELA R. MADEIRA:

O diálogo se iniciou com a apresentação da problemática enfrentada, há anos pela indústria de brinquedos nacional, desde que, o MEC – Ministério da Educação, através do FNDE – Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação promoveu em 2013, uma grande Ata de Registro de Preços que visava abastecer todas as escolas públicas nacionais de Educação Infantil (para crianças de 0 a 5 anos e 11 meses) com brinquedos. Apesar da intensa mediação por parte da ABRINQ – Associação Brasileira de Fabricantes de Brinquedos, houve uma enorme frustração no mercado nacional, pois, dos 47 itens licitados, apenas 25% foram atendidos.

A partir desse momento, sentiu-se a necessidade de estudar aos aspectos que caracterizariam um brinquedo apto para o uso coletivo em escolas, brinquedotecas e playgrounds. Formamos então um grupo de trabalho – no Comitê de Brinquedos (CB 198) – ligado a ABRINQ e a ABNT. Um GT estruturado a partir da participação voluntária de profissionais do setor que já haviam se aprofundado no desenvolvimento de uma norma ABNT ISO/TR 8124-8 – Brinquedos – Determinação da Faixa Etária que foi utilizada como “ponte” para chegarmos às principais características que tais brinquedos deveriam possuir. Esses aspectos serão apresentados mais detalhadamente a seguir.

Depois da explicação desse panorama, passamos a palavra primeiramente para a educadora Mary Iglesias que trouxe um compilado de demandas da educação.

EDUCADORA MARY IGLEZIAS:

A educadora apresentou uma série de expectativas em relação a brinquedos, relatando aspectos e características que pouco são encontradas no mercado nacional. Vários comentários tecidos entre seus pares que foram aqui relatados conforme segue: nota-se a necessidade de maior variedade de estímulos sensoriais como: diferentes texturas, rugosidades, sons, cheiros e superfícies espelhadas, não apenas feitos de plástico.

Sente-se a necessidade de associação de materiais de outra natureza, como madeira, ou fibras representando cabelos nos bonecos, por exemplo. Os bonecos encontrados representam estereótipos. Por que é que a boneca tem que ser loira e usar roupas cor de rosa? Falta oferta de bonecas de diversas etnias. A criança tem a necessidade de se identificar com os brinquedos e eles poderiam trazer as características do que é real aqui no Brasil. Somos um povo miscigenado, mas não é o que vamos nos bonecos vendidos no Brasil. Enfim, é importante que o brinquedo crie maior representatividade com a criança, ou seja, que sejam fabricados bonecos cadeirantes, bonecos com vitiligo etc. O objetivo é trazer a diversidade para o brinquedo, como uma forma de convívio mais amplo.

A Robótica pode também acrescentar muito aos brinquedos, através de montagens dirigidas ou livres que proporcionam movimentos nos brinquedos que as próprias crianças venham a construir. Fora do Brasil existe a oferta de brinquedos com metal, ou aço inoxidável, brinquedos de encaixe e encaixes que não se fixam de uma única forma. Na China, por exemplo, crianças por volta dos 9 anos constroem seus próprios drones nas escolas. A proposta de salas de aula invertidas – onde os alunos pesquisam em casa sobre um tema antes mesmo dos professores o explicarem e vão para escolas tirar dúvidas a respeito – são muito interessantes e o próprio conceito “maker” é muito interessante, mas, é necessário que se tenha recursos, ferramentas, materiais alternativos para que se possa trazer o imaginário para a CONSTRUÇÃO. A criança deve sair da passividade, não precisa receber algo totalmente pronto, mas sim, algo que possa ser construído por ela mesma. Dentro dessa proposta, deve-se tomar cuidado para não proporcionar aos alunos materiais que ofereçam alguma toxicidade, ou algo inflamável, além de materiais que possam ser facilmente higienizados. 

Não estimular a violência também é algo muito importante. Pequenos hábitos acabam se tornando costumes, portanto, é importante haver o cuidado de não propor algo que se incite a violência.

Outro aspecto importante é em relação aos triciclos oferecidos no mercado, que, ao chegarem nas escolas, perdem suas rodas rapidamente. Não temos reposição de peças.

Em relação a brinquedos de parque, esses ficam expostos ao sol e acabam rachando, enrugando – precisamos de algo onde, o desgaste do material não aconteça num curto espaço de tempo. Talvez mais opções de paredes de escaladas, algo para colocação de blocos de tamanhos diferentes. Isso é importante porque uma única sala de aula acolhe crianças de diversos tamanhos.

Espelhos são importantes. Materiais recicláveis além da madeira (materiais que aparentemente seriam descartados também tem uma participação importante na sala de aula).

Após a fala da educadora, passamos a palavra ao primeiro profissional da indústria que participa tanto das definições de marketing como da área comercial.

PROFISSIONAL DA INDÚSTRIA – SR. LUIS ILLANES – FRESO PLAYGROUNDS:

A Freso é especializada na fabricação de brinquedos rotomoldados (ou moldagem rotacional) para playgrounds e brinquedos para ambientes indoors também – com uma linha que favorece a brincadeira simbólica, oferecendo a resistência e a produção em grande escala que na maioria das vezes a não se encontra em produtos de madeira. Em relação a algumas das queixas pontuadas pela educadora, importante ressaltar que nem todos osprodutos rotomoldados de grande porte do mercado são certificados e o processo de certificação aqui no Brasil é caro e bem rigoroso. Uma certificação que anualmente tem que ser renovada fazendo-se ou não alguma alteração nos produtos. A empresa oferece reposição de peças para os playgrounds que passam por todos os testes de segurança física, como aprisionamento de dedos e testes químicos que checam sobre a toxidade.

O relacionamento da indústria de brinquedos com a educação é de extrema importância. Na tentativa de aproximação que houve em meados de 2013 as compras foram muitos pequenas e ficaram aquém das expectativas. O Brasil possui por volta de 450 fabricantes de brinquedos é muito triste conceber que quando um educador precisa de algo tem que viajar para fora do país pra buscar produtos com conceitos diferenciados e com qualidade superior ao que é fabricado no Brasil. Retomar o contato com o MEC/FNDE é algo que a indústria nacional precisa que aconteça. Mais do que isso, o contato com pessoas que possam orientar a indústria sobre o que deve ser produzido é fundamental.

Produtos de uso doméstico não vão resistir ao uso exaustivo das escolas. As regras de brincadeira em grupo são diferentes e isso é algo bem bacana para as crianças na questão de: aprender a respeitar a vez do outro e dividir o mesmo espaço. Essa brincadeira coletiva – que o BUC aborda – tem muito a acrescentar para o desenvolvimento das crianças. E em relação às características definidas como essenciais pelos brinquedos de uso coletivo, elas definirão quais brinquedos podem ou não ser usados em ambientes coletivos.

Passamos a palavra para um segundo profissional da indústria que gerencia uma linha produção com o objetivo de comentar os aspectos levantados e apontar algumas limitações referentes aos processos produtivos de brinquedos.

PROFISSIONAL DA INDÚSTRIA – SR. ADAILSON PARRA – MAGIC TOYS BRINQUEDOS

Desde 2016, o GT de BUC, tem analisado diversos aspectos que provavelmente nenhuma empresa teria ainda levado em consideração no momento de projetar novos brinquedos. Algo que nós já éramos obrigados a considerar era o abuso razoavelmente previsível, pois, o processo de certificação já nos direciona para isso. Mas, em se tratando de BUC, os abusos são outros. Quando as crianças brincam juntas outras coisas devem ser previstas.

Novos processos de fabricação se fazem necessários com custos diferenciados. No processo de injeção, por exemplo, as paredes dos brinquedos mais espessas, trazem mais resistência, mas causam em um impacto direto no custo do produto. Quando consideramos os preços dos brinquedos que são fabricados na China e chegam no Brasil com preços competitivos, isso dificulta muito a vida dos fabricantes, que normalmente, se vê forçado a sacrificar um pouco na qualidade, para ter / lançar produtos que possam competir com esses no ponto de venda. O exercício de pensar em maior resistência, acaba nos levando a fazer um caminho de volta, isto é, ao pensar no BUC podemos partir de algo super-resistente e adaptar para o uso doméstico. Os brinquedos têm uma característica muito peculiar, pois o nível de investimento em moldes é alto e lançar algo que pode ou não dar certo é sempre arriscado. A consultoria da educação para o desenvolvimento de produtos é importante e dá mais segurança para se investir, principalmente em BUC que serão sempre brinquedos mais estruturados e consequentemente com custos e preços mais elevados.

É preciso linkar a indústria com esse mercado. O conhecimento desse trabalho pelo MEC/FNDE tende a nos levar a produtos com especificações mais flexibilizadas e factíveis. A partir do momento que passarmos a ter licitações de BUC, teremos mais ofertas de produtos com mais qualidade no mercado. A seriedade que vem sendo levado esse assunto tem feito a diferença. Precisamos também do envolvimento dos organismos de certificação para que façamos uma “receita de bolo” para BUC. A indústria do brinquedo nacional é séria, temos como buscar esse novo direcionamento.

Em relação a utilização de outros materiais além da madeira, temos buscado também outros substratos que podem ser utilizados e mais bem explorados com o desenvolvimento da tecnologia, não de forma artesanal como a grande maioria dos brinquedos de madeira eram ou são fabricados. Mesmo na injeção de plásticos, é possível se obter a integração de substratos diferentes. A sobreposição de injeção – como vemos hoje nas escovas de dentes, por exemplo é um caminho que temos buscado trilhar. Isso é bom, pois, agrega valor ao produto e desperta o olhar do consumidor. Fazer uso de ataques químicos, ou injetar serragem de madeira, são outros exemplos. A Vantagem do plástico, é que tudo vira plástico novamente.

Infelizmente, há um contrassenso no que diz respeito às novas gerações, ao mesmo tempo que os educadores pedem produtos que despertem mais a cognição, a cada dia, as crianças fazem mais uso do digital.

Para concluir nosso diálogo convidamos o Sr. Mariano Bacellar, que atua no mercado de brinquedos há anos e além da experiencia como fabricante, muito tem nos orientado com todo o seu conhecimento a respeito das normas de certificação de brinquedos tanto nacionais como internacionais. Alguns aspectos importantíssimos foram levantados.

PROFISSIONAL DE CERTIFICAÇÃO – Sr. MARIANO BACELLAR – INNAC:

Tanto os profissionais da educação, como os profissionais da indústria se manifestam nesse diálogo como dois grandes pilares distintos sustentando a mesma finalidade que é o desenvolvimento infantil.

Nesse momento, é importante que os profissionais da educação conheçam um pouco do trabalho que vem sendo feito pelos profissionais da indústria de brinquedos. Existe uma norma de brinquedos internacional chamada ISO/TR 8124 que foi desenvolvida aqui no Brasil.  Essa talvez seja a única norma internacional totalmente desenvolvida aqui no Brasil. Essa norma foi desenvolvida a partir da utilização de duas estruturas: o sistema ICCP – International Council for Children’s Play que classifica, de forma muito inteligente, os brinquedos a partir de suas funções em 7 grandes categorias e um grande trabalho americano chamado Age Determination Guidelines- Relating children´s age to toy characteristics- Consumer Product Safety Commission- CPSC 2002, onde habilidades cognitivo-motoras são relacionadas em função das faixas etárias. A equipe brasileira fez uma fusão inédita – o cruzamento dos dois documentos e isso foi excelente. Hoje existe uma aproximação mais científica do que uma criança pode e sabe fazer em determinadas idades. Essa norma ISO traz para os fabricantes aquilo que eles precisam.

Agora, em relação ao que estamos fazendo em BUC – brinquedos de uso coletivo, isso é algo bem diferente, porque a forma como um grupo de crianças brinca junto é bem diferente da forma como essa criança brincaria sozinha. Como será que um grupo brinca?

Dependendo do tipo de brinquedo, as crianças aprendem facilmente – no caso de brinquedos para atividades físicas[1], por exemplo.  Num ambiente coletivo não há muita dificuldade no uso de brinquedos de playground. Em relação aos brinquedos que representam o mundo técnico isso também acontece de forma natural. As crianças assimilam facilmente seu uso.  Mas, a maneira de brincar é que é diferente. Foi uma surpresa para o grupo de trabalho quando colocamos os brinquedos para serem testados na prática nas escolas. A forma de brincar exige muito mais dos brinquedos. (Crianças formando dois grupos, cada um com um grande e robusto caminhão, vinham correndo de lados opostos, e os caminhões onde se apoiavam “batiam de frente” um contra o outro num impacto enorme: que fabricante imaginaria que seus produtos seriam submetidos a tais esforços?)

O uso coletivo precisa ainda de um refinamento. Em laboratório, temos conseguido medir um uso previsível aplicando maior carga: com peso x choque previsíveis. Mas na maioria das vezes, na prática, as crianças ultrapassam aquilo que é previsto.

Em relação aos brinquedos de uso afetivo, as coisas ficam ainda mais difíceis. Não conhecemos o verdadeiro conceito ambiental das crianças. Nosso olhar é de certa forma preconceituoso, baseado em nossas vivências, mas não sabemos, exatamente, qual o universo que as crianças aceitam como normal.

Coletivamente como ela vê a boneca? A norma prevê a resistência, mas, como será a roupa dessa boneca?

O que será que ela gosta de vestir e como gosta de ver sua boneca vestida?  Quem está estudando isso? Como coletivamente os brinquedos são vistos? Qual é o universo em que ela está inserida coletivamente? Não sabemos!


[1] As famílias se encontram relacionadas no anexo 1

Nosso olhar não acompanha esse olhar infantil hoje. O agradável para o adulto da indústria que cria o brinquedo é o mesmo agradável à vista para a criança que hoje vive em uma comunidade (nome atual das favelas)? Nosso Grupo de Trabalho (GT) viveu um exemplo disso, em relação aos olhos da boneca. Pensamos inicialmente em olhos que se abrem e fecham “quando se nina a boneca nos braços”. Mas quem acha lindo isso? Nós com o nosso referencial de brincadeira de muitos anos atrás?  Nós que fomos crianças no século XX?

Acabamos abandonando essa opção. Mas, as crianças de hoje preferem que tipo de olhos? Olhos pintados “tipo mangá”, alongados e arregalados?

Esses são os olhos dos heróis e heroínas das crianças de hoje? Qual será a forma que vai ser feita a brincadeira? As crianças atuais irão brincar da mesma forma? Embalando seus bebês como acontece com eles na “vida real”?   Essa é a base educacional que vamos atribuir aos brinquedos de uso coletivo? Não sabemos! Nosso grupo não tem essas respostas. Como deve ser o faz de conta coletivo? Não sabemos!

Devolvemos essa pergunta para os educadores e estudiosos que observam as crianças brincando em grupo. Temos que ter um embasamento para dar para o MEC/FNDE. Temos que ter esse tipo de visão: como as crianças que estão nesse tipo de agrupamento consideram que atendemos a necessidade social da brincadeira?

Um aspecto do mundo afetivo nós conseguimos fazer, temos como realizar os aspectos físicos das bonecas, como uma média da população brasileira. (Haja visto a tendência do que vem feito a Mattel com a boneca Barbie – diversos tipos de cor e faces). Devemos pensar em fazer para ao MEC bonecas que atendam toda a geografia humana do nosso país, com bases étnicas tão diferentes?  Temos que pensar na capacidade do desdobramento cerebral das crianças, com os elementos que daríamos para isso. Elas teriam o espírito maior de cooperação e seriam menos competitivas? Aprenderiam a ser mais inclusivas?

Na observação em campo, uma criança leva, no carrinho de boneca, uma bola, por exemplo. Temos que nos despir da nossa visão. Como deve ser o “faz de conta” coletivo? Não conhecemos. Devemos fazer por aproximação, a partir do que se pode ver acontecendo na prática, ou fazer parâmetros gerais? O MEC/FNDE fará algo geral para o Brasil? Temos que ter um embasamento para oferecer algo que seja plausível. (Desde comunidades bem pobres do Centro Sul como de pequenas cidades do interior do Nordeste?). Temos que ter essa visão de pequenos grupos e do coletivo. Qual a necessidade social dessa brincadeira?

Em relação aos brinquedos para criatividade, poderemos incluir blocos grandes com possibilidades variadas de construção de brinquedos não prontos – um universo criado pelas próprias crianças. Temos como desenvolver produtos que permitam isso. Podemos sugerir brinquedos com essas possibilidades!

Algumas coisas já fizemos: brinquedos laváveis, bonecas de acordo com as etnias do Brasil com cabelos e acessórios corretos, representação natural dos gêneros. Mas quanto às características fisionômicas – temos que fazer uma média? Temos mais latinas, negras ou orientais? A indústria não pode se responsabilizar sobre isso, mas os educadores sim. A maneira de brincar, as projeções, o enfrentamento do diferente, os educadores é que terão que definir!

CONCLUSÃO POR ÂNGELA R. MADEIRA – Encontros como este são fundamentais. Esse tipo de aproximação tem reduzido as distâncias entre esses dois mundos: a indústria de brinquedos e a educação. O nosso grande público está dentro das escolas. Que elas sejam verdadeiras “salas de espelho” para a indústria. Mas, de qualquer forma, o sucesso desta equação envolve um trabalho de “co-criação” entre fabricantes, educação e universidades.

COLABORAÇÃO DE PARTICIPANTES – Sra. CECÍLIA AFLALO –

Não é de hoje que se faz necessário incrementar a escuta da criança. A brinquedoteca também deve ser considerada como um recurso de observação da criança. O Guia de Brinquedos desenvolvido pela ABRINQ sempre foi focado em observar o brinquedo. A avaliação era do brinquedo e não a criança. O brinquedo de uma forma geral: desde as regras até o desempenho do brinquedo no grupo.

ANEXO 1

Princípios teóricos da classificação de brinquedos:

Entre os estudiosos do brinquedo e suas interações, André Michelet se destaca quando compara e conclui que: “tanto as escolas da psicologia do desenvolvimento representadas por Wallon e Piaget que veem o brinquedo como meio de experiências que permite à criança analisar o mundo e construir a sua individualidade, assim como, da psicologia profunda representadas por Melaine Klein e Winnicott que colocam o brinquedo como instrumento de unificação da personalidade da criança compactuam da ideia de que a criança deve desenvolver-se de forma harmoniosa: corpo (motor e sensorial), inteligência (reflexão, aquisição), afetividade (transferência e imitação), criatividade (imaginação e iniciação artística) e sociabilidade ( intercâmbios e aceitação de regras)”[1]

Tendo assim, o brinquedo sido reconhecido como um mediador, Michelet direcionou seus estudos para o desenvolvimento de uma matriz que correlaciona as diferentes necessidades de uma criança e as várias contribuições dos brinquedos em função da idade (por exemplo:  a criança não joga bola da mesma forma aos 3 anos e aos 8). Sua matriz considera simultaneamente os brinquedos, as idades e os principais componentes da personalidade da criança. Um único brinquedo pode auxiliar no desenvolvimento de forma diferente em cada criança dependendo da idade em que é oferecido a ela.  Mais detalhadamente, podemos acompanhar esses conceitos através dos princípios explorados em sua obra: “CADA BRINQUEDO TEM SUAS IDADES. CADA IDADE TEM SEUS BRINQUEDOS[2]”, publicada pelo Centre National D’Information Du Jouet (França, 1980) e não traduzido para o Brasil.

A norma ABNT ISO/TR 8124-8 contém as mesmas 7 famílias de produtos, com faixas etárias iniciais vinculadas a cada uma das 148 subcategorias. Essa revisão da classificação teve grande repercussão junto aos demais grupos de estudos de segurança de brinquedos de outros países ligados a ISO e foi levada a consulta pública internacional e aprovada como relatório técnico ABNT ISO/TR 8124-8 Safety of toys AGE DETERMINATION GUIDELINES.  O documento é destinado a fabricantes e organismos de avaliação da conformidade da segurança de brinquedos, mas pode, perfeitamente, ser utilizado como referência de adequação de brinquedos por faixa etária, por distribuidores, instituições e organizações destinadas ao entretenimento infantil, assim como, por instituições pedagógicas, educadores, profissionais de áreas diversas que utilizam brinquedos em sua rotina, bem como por consumidores em geral.

  1. Brinquedos para atividades sensório-motoras – primeira idade
  2. Brinquedos para atividades físicas
  3. Brinquedos para atividades intelectuais
  4. Brinquedos para atividades que representam o mundo técnico
  5. Brinquedos para o desenvolvimento afetivo
  6. Brinquedos para atividades criativas
  7. Brinquedos para relacionamentos sociais

[1] O sistema ICCP de classificação, O Direito de brincar: A Brinquedoteca (1985)

[2] “À chaque jouet ses âges. À chaque âge ses jouets.” (1980) publicada pelo Centre National D’Information Du Jouet (França, 1980)

Programa de avaliação da resistência:

Para que possamos chegar a uma nova NORMA contendo os níveis de resistência ideias para produtos de uso coletivo intenso, pretendemos analisar primeiramente a lista de brinquedos que solicitados pelo MEC/FNDE.

Classificando os brinquedos dessa lista, através do dessas 7 famílias, pode-se claramente enxergar a presença dos brinquedos que incentivam a brincadeira simbólica (tabela 1).

CATEGORIAS%BRINC SIMBÓLICATIPOS DE BRINQUEDOS
SENSÓRIO MOTOR110,87% Conjunto de encaixe de blocos – madeira
1Conjunto de almofadas – tecido
1Almofadão – tecido
1Minhocão – túnel de pano – tecido
1Conjunto de bicho com filhotes – tecido
ATIVIDADES FÍSICAS210,87% Conjunto de bolas – borracha
2Conjunto de bolas com guizo – borracha
2Conjunto de bolas de futebol – vinil
2Conjunto de bolas de volley – vinil
2Conjunto de bolas de basquete – vinil
ATIVIDADES INTELECTUAIS317,39% Conjunto de Encaixes – Cabeça Mamãe e Filhotes – papelão
3Conjunto de Quebra – Cabeça Progressivo – papelão
3Conjunto dominó com textura – MDF
3Conjunto jogo da memória com textura – MDF
3Conjunto jogos profissões – MDF
3Conjunto passa peça – MDF
3Conjunto de blocos lógicos – MDF
3Conjunto de jogo de peças sopradas para encaixe – plástico
REPRODUZEM MUNDO TÉCNICO413,04%47%Conjunto de caminhão Coletor de Lixo – plástico
4Conjunto de caminhão tipo cegonha – plástico
4Conjunto de caminhão tipo caçamba – plástico
4Conjunto de caminhão tipo Bombeiro – plástico
4Conjunto de avião Bi-Plano – madeira
4Cavalo de balanço – madeira
RELAÇOES AFETIVAS532,61%Conjunto de boneca bebê negra – vinil
5Conjunto de boneca bebê branca – vinil
5Conjunto de boneco menino branco – vinil
5Conjunto de boneco menino negro – vinil
5Conjunto de boneca menina branca – vinil
5Conjunto de boneca menina negra – vinil
5Conjunto de berço para bonecas – metal
5Conjunto de carrinho de boneca – metal
5Casinha de boneca – madeira
5Pia de cozinha – MDF
5Fogão – MDF
5Geladeira – MDF
5Conjunto caixa brinquedoteca – MDF
5Conjunto de telefone sem fio – plástico
5Conjunto de máquina fotográfica – plástico
ATIVIDADES CRIATIVAS615,22% Bandinha rítmica
6Conjunto Fantoche Família Negra
6Conjunto Fantoche Família Branca
6Conjunto de Fantoche Folclore
6Conjunto de Fantoche Animais Domésticos
6Teatro de Fantoche – madeira
6Teatro de Fantoche – tecido
  100,00%  Tabela 1

Fazendo uso do levantamento estatístico anual[1], realizado pela ABRINQ, pode-se analisar a distribuição do total de brinquedos lançados pelas aproximadamente 200 empresas associadas, nas 7 categorias, conforme demonstrado na tabela 2.

Somando o total de brinquedos fabricados nas categorias 4 e 5 pode-se medir a participação dos brinquedos simbólicos produzidos atualmente pela indústria nos últimos 10 anos. Mas vale lembrar que tais resultados dizem respeito a brinquedos que, em primeira instância, não possuem a “RESISTENCIA/DURABILIDADE“ desejada  para o segmento INSTITUCIONAL.

Para que esses novos mercados possam fazer uso dos brinquedos fabricados atualmente no país (do total aqui contabilizado), com segurança, caberia aos fabricantes submeter esses itens a uma criteriosa avaliação de RESISTENCIA.  Aprimorando a DURABILIDADE do que já é produzido ou ainda, lançar uma linha de produtos com qualidade diferenciada, isto é, uma linha de brinquedos para uso institucional.

Percepção e valorização da brincadeira simbólica

Dentro da proposta de co criação, temos alguns casos já realizados no Brasil:

  1. Linha de Mini mobílias rotomoldadas
  2. Fogões e geladeiras injetadas
  3.  Caminhões,
  4. berços e carrinhos de Bebê
  5. Escritórios de representação comercial especializados em brinquedos para uso coletivo intenso.

[1] Desempenho do Setor de Brinquedos, 2015

Bibliografia:

O papel do brinquedo no desenvolvimento. A FORMAÇÃO SOCIAL DA MENTE: O desenvolvimento dos processos psicológicos superiores. / L.S. Vigotski Editora Martins Fontes, 2007.

O DIREITO DE BRINCAR: a brinquedoteca/ Adriana Friedman ….et al.ABRINQ, 1992.

BRINQUEDOS E BRINCADEIRAS NAS CRECHES: Manual de orientação pedagógica / Ministério da Educação.  Secretaria ade Educação Básica- Brasília: MEC/SEB, 2012. Tizuko kishimoto, Adriana Fryeberger

A EDUCAÇÃO INFANTIL NOS PAÍSES DO MERCOSUL: análise comparativa da Legislação / Ministério da Educação Secretaria da Educação Básica. MEC. SEB, 2013.

DIRETRIZES CURRICULARES NACIONAIS PARA A EDUCAÇÃO INFANTIL / Secretaria da Educação Básica – MEC, SEB, 2010.

Pesquisa: BRINQUEDOS E MATERIAIS PEDAGOGICOS NAS ESCOLAS INFANTIS / Tizuko Morchida Kishimoto , Universidade de São Paulo, 1998.

OS PRINCÍPIOS PSICOLÓGICOS DA BRINCADEIRA PRÉ-ESCOLAR/ Alexis N. Leontiev.

O FNDE E SUA LEI DE CRIAÇÃO – OBJETIVOS.

ORIENTAÇOES CURRICULARES PARA A EDUCAÇÃO INFANTIL DA REDE MUNICPAL DE FLORIANÓPOLIS / Prefeitura Municipal de Florianópolis, Secretaria Municipal de Educação. Florianópolis, SC, 2012.

À chaque jouet ses âges. À chaque âge ses jouets.” (1980) publicada pelo Centre National D’Information Du Jouet (França, 1980)

ISO/TR 8124-8  Safety of toys – AGE DETERMINATION GUIDELINES.

“ICCP REVISÃO 2013”/ Comissão Estudos Especiais ABNT, 2013.

Desempenho do Setor de Brinquedos, 2014 /ABRINQ – Associação Brasileira dos Fabricantes de Brinquedos, São Paulo.

FNDE/SIGARP , 08/07/2014 www.fnde.gov.br

Guia de Brinquedos e Jogos, 2014 / Abrinquedoteca www.abrinquedoteca.com.br

Norma MERCOSUL de segurança de Brinquedos – NM300:2002, adotada pela portaria nº 108, de 13 de junho de 2005.

Carrinho de compras
Scroll to Top